Alguns anos atrás, muitos anos atrás, precisei levar meu carro a uma oficina mecânica. Ela já não estava na garantia – aliás, quando eu o comprei, ele já não estava – e a grana estava curta para levar a uma concessionária. Então, na base das indicações de amigos, fui a uma pequena oficina no meu bairro. E logo ao entrar, deparei com uma grande placa onde se dizia:
NESSE ESTABELECIMENTO, TRABALHAMOS COM TRÊS QUALIDADES: PREÇO BAIXO, SERVIÇO BEM FEITO E ENTREGA RÁPIDA. ESCOLHA DUAS.
Sinceridade maior, não se pode exigir. Não dá para ter tudo na vida. Se você quer um serviço rápido e bem feito, pague por isso. Quer pagar pouco e entrega rápida, não reclame depois da qualidade do serviço. Quer barato e bem feito? Vai demorar.
No mundo dos investimentos, esse dilema também se apresenta, sob a forma do tripé rentabilidade, liquidez e risco. Não é para ter o melhor dos três, que seriam alta rentabilidade, liquidez total e nenhum risco. Um deles precisa sofrer para que os outros prosperem. Rentabilidade é algo que dispensa apresentações, e não é difícil de entender. Então vamos conversar um pouco sobre as outras duas variáveis: a liquidez e o risco.
A liquidez se traduz pela facilidade maior ou menor de acessar o dinheiro investido a qualquer tempo, sem prejuízo, e recebendo rentabilidade proporcional ao tempo em que os recursos ficaram investidos. Quando pensamos em recursos que precisam estar disponíveis imediatamente, que é o caso da reserva de emergência necessária para a tranquilidade de qualquer família, não podemos abrir mão de liquidez total. Nesse caso, exigir alta liquidez significa aceitar rentabilidade acanhada, ou correr riscos maiores. Já se pudermos prescindir desses recursos por mais tempo, podemos abrir mão da liquidez, investindo em ativos com carência para o resgate, como fundos de investimento, CDBs com prazo maior ou Títulos de vencimento longos. Geralmente essa escolha permite ao investidor obter melhores remunerações, sem maiores riscos. Quando podemos abrir mão de liquidez por um longo – mas longo mesmo – tempo, investimentos de baixa liquidez, como os imóveis, podem ser uma opção.
Já o risco se traduz em duas vertentes, o risco de crédito e o de mercado. Hoje, com cada vez mais investidores correndo para o mercado de capitais, o risco de mercado tem sido melhor entendido. Investir em ações é o suprassumo desse risco. Volatilidade, variações bruscas de preços – para o alto ou para o fundo – ingerências políticas, são inúmeras as variáveis que podem influenciar a rentabilidade desses ativos. Moedas estrangeiras entram também nesse rol.
Mas não pense que apenas investimentos em renda variável sofrem pelo risco de mercado. Investir em ativos de renda fixa também exigem cuidados. Títulos prefixados, sejam públicos ou privados, estão expostos a esse risco. Muita gente pensa que, por se tratar de “renda fixa”, Títulos prefixados têm renda garantida. Isso é verdade se o investidor aguardar o vencimento do ativo, ou seja, se ele abrir mão de liquidez. Se ele precisar resgatar antes do vencimento, estará sujeito à marcação a mercado. Se um mercado otimista, com taxas de juros em queda pode representar um resgate com ágio, ou seja, um lucro até maior do que o prometido em caso de resgate antecipado, um horizonte sombrio pode indicar deságio em caso de resgate. Nesse caso, o investidor terá que se conformar com um desconto no preço de venda de seus títulos, o que pode representar prejuízo.
Mas e o risco de mercado? Esse muitas vezes tem tido bem menos atenção. Mas ele não deve ser minimizado, pois é real e imediato, pois é o risco de calote. Investir nada mais é que emprestar dinheiro para alguma instituição, seja ela pública ou privada. O risco de mercado se traduz em não receber o seu dinheiro de volta. São considerados ativos livres de risco apenas os Títulos Públicos Federais. Emprestar dinheiro através de qualquer outro mecanismo embute algum risco de crédito. Levar um calote significa que, no vencimento, o tomador alegar um “devo, não nego. Pago quando puder”. O investidor vira credor, e entra na fila de uma – incerta - recuperação financeira do devedor.
Bancos emitem CDBs, RDBs, LCIs, LCAs, COEs, poupança. Empresas privadas emitem debêntures, letras de câmbio, FDICs, etc. Adquirir esses títulos significa emprestar dinheiro para essas instituições. Quanto maior e mais sólida a instituição, menor o risco de crédito, e provavelmente também será menor a rentabilidade prometida. Instituições que oferecem rentabilidade maior, provavelmente, estão precisando se capitalizar mais, seja porque estão endividadas, seja porque não têm recursos próprios para investir em seu negócio. Tomar dinheiro do investidor sai mais barato que apelar para empréstimos em bancos. Empresas nessas condições podem representar maior risco de crédito. Depósitos feitos em instituições bancárias são protegidas pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), uma espécie de seguro patrocinado pelos próprios bancos, para proteger o pequeno investidor, em até R$250 mil por CPF por instituição devedora. Mas um calote, mesmo protegido pelo Fundo, pode representar meses de espera até que esse seguro realize o ressarcimento a todos os investidores.
Já os Fundos de Investimento não têm essa proteção. Ao investir, você assume o risco de crédito de o Gestor do Fundo não fazer uma boa gestão dos ativos que compõem esse fundo. Cada Fundo tem um CNPJ próprio, e pode simplesmente quebrar, em caso de má gestão. Nesse caso, não adianta reclamar, só chorar na cama, que é lugar quente. Então, estudar o prospecto do fundo antes de colocar o seu dinheiro lá é um cuidado pra lá de necessário.
Resumo da ópera: na hora de encostar o carro na oficina, temos que entender que não dá para ter serviço bom, barato e rápido ao mesmo tempo. Mas na hora de investir o seu dinheiro, tem jeito de aproveitar o melhor dos três mundos: a diversificação. Para a sua reserva de emergência, aceite uma remuneração conservadora, priorizando alta liquidez e baixo risco. Para aquele dinheiro que você sabe que pode esperar o prazo contratado para pegá-lo de volta, busque um pouco mais de rentabilidade, abrindo mão de um pouco de liquidez. E para aquele patrimônio que vai sendo construído aos poucos, ao longo de muitos anos, uma boa gestão da volatilidade vai permitir ao investidor uma exposição maior ao risco de mercado. Tudo é um questão de bom Planejamento Financeiro.